A síndrome do impostor encontra terreno fértil entre os estudantes de mestrado e doutorado.
Você já sentiu aquela sensação de não ser tão bom, esperto, inteligente e produtivo quanto todo mundo diz que você é? Acredite, boa parte das pessoas altamente produtivas se sentem assim.
No ambiente competitivo de uma pós-graduação, tal sentimento, comum entre os estudantes que cursam ou almejam cursar um mestrado/doutorado ou já cursam pós-graduação, pode impactar profundamente a performance acadêmica.
O que é a síndrome do impostor?
Quem nunca se sentiu assim? Depois de já ter dado inúmeras provas de sua capacidade acadêmica e intelectual, você sente que seu lugar não é ali.
Existem muitas pessoas que possuem o interesse de cursar uma pós-graduação stricto sensu, mas passam anos a fio sem sequer se submeter ao processo seletivo. O motivo? Muitas sentem que não têm capacidade suficiente para participar de um curso. Colocaram o mestrado e o doutorado em patamar tão elevado que não se julgam dignas de participar do meio acadêmico.
Pior: muitos sentem que são uma fraude, mesmo depois de terem sido bem sucedidos em vários aspectos de suas vidas. São excelentes profissionais, já publicaram em revistas acadêmicas de boa reputação e talvez já tenham até sido aprovados no processo seletivo e estejam matriculados no mestrado/doutorado. Mas, ainda assim, sentem não pertencerem àquele ambiente.
Dificuldade de aceitação de seus próprios méritos é característica da síndrome do impostor
Uma característica da síndrome do impostor é o sentimento de que os sucessos alcançados na vida acadêmica decorreram do “acaso” ou da “sorte”, porque não enxergam o que resulta de sua competência e esforço. Rotineiramente, diminuem seu próprio papel nos resultados que obtém e encontram fatores externos para explicar o porquê de terem se saído bem até o momento. Embora tenham reconhecido mérito, muitos tentam minar suas próprias chances de sucesso utilizando estratégias para não alcançá-lo.
Alguns exemplos dos pretextos mais invocados para evitar o sucesso: deixam pra fazer tudo de última hora porque, se não forem bem sucedidos, têm a “desculpa” de que não tiveram tempo; não se engajam para ocupar postos em que poderiam utilizar suas capacidades plenamente; buscam se esconder em atividades menos significativas. Assim, evitam ser avaliadas e se acomodam, acreditando que é o caminho mais correto para ficarem “invisíveis” e ninguém descobrir que são, na “verdade”, uma fraude (quando não são!).
A síndrome foi descoberta há quarenta anos, por Pauline Clance e Suzanne Imes, da Universidade da Geórgia. Em artigo publicado em 1978, descreveram a situação de mulheres que, embora extremamente bem sucedidas profissionalmente e academicamente, se autoboicotavam e se consideravam impostoras. Na década de 1980, Gail Matthews (Universidade Dominicana da Califórnia) e Pauline Clance descobriram que o fenômeno também atingia os homens. Na verdade, até 70% das pessoas bem sucedidas poderiam ser diagnosticadas como portadoras da síndrome em algum momento de suas vidas.
Principais sintomas da síndrome do impostor
Os principais sintomas da síndrome do impostor são os seguintes:
- Perfeccionismo: as vítimas da síndrome buscam ser extremamente satisfeitas com seu trabalho e, com isso, tendem a postergar sua conclusão indefinidamente. Acreditam que jamais conseguirão alcançar o nível esperado e sofrem com altos níveis de ansiedade, dúvida e preocupação por não conseguirem alcançar resultado digno do padrão pretendido.
- Minimizam o sucesso obtido: quem padece da síndrome tende a se concentrar nos desafios a serem superados, esquecendo rapidamente os sucessos alcançados até o momento.
- “Workaholic”: a fim de mascarar a autopercebida (e falsa) incompetência, quem padece da síndrome do impostor usualmente trabalha demais, a fim de garantir que ninguém “descubra” sua “farsa” e o desmascare.
- Não se consideram dignas de elogios sinceros: muitas das vítimas entendem que não merecem o sucesso e o reconhecimento alcançado e, por essa razão, se sentem desconfortáveis quando são elogiadas sinceramente. Por isso, atribuem seu sucesso a fatores como sorte, acaso…
A síndrome, embora comum no meio acadêmico, não se limita a ele. Mesmo atores famosos são ou foram vítimas da enfermidade. A premiadíssima Meryl Streep, por exemplo, já disse em entrevista: “por que alguém assistiria a mim novamente em um filme? E não sei como atuar, como estou fazendo isso?”. Do mesmo modo, a brilhante Natalie Portman assumiu que “quando entrei em Harvard logo após o lançamento de Star Wars: Episódio I, tive medo de as pessoas assumirem que cheguei lá apenas por ser famosa, e não por ser digna do rigor intelectual”.
E poderíamos citar outros tantos, de Tom Hanks a Kate Winslet, passando por Jodie Foster e Ryan Reynolds. Se esses aí se sentem impostores, imagine o que não sobra para os meros mortais? Nós, que temos de matar nossos leões todo santo dia?
Dez estratégias para superar a síndrome do impostor
As características do meio acadêmico, assim como as do do cinema e do meio artístico em geral, ajudam a impulsionar os sentimentos de inadequação, fracasso e de falta de merecimento do sucesso alcançado. A reitora do College of Arts and Sciences da Universidade Duke (indicada em 2015), Valerie Ashby, é um exemplo do problema nas universidades. Apesar de ter conquistado inúmeros prêmios em sua carreira, a professora não se sentia digna daquilo que alcançou por seus próprios méritos. Para superar a síndrome, a professora seguiu dez estratégias básicas que a ajudaram a deixar pra trás o sentimento de inadequação e a abraçar seu próprio sucesso como merecido.
Rompa o silêncio.
Uma das características da síndrome de impostor é buscar “esconder debaixo do tapete” a poeira dos próprios erros. Evita-se, com essa estratégia, ser exposto quanto aos sentimentos de ser uma fraude e de o sucesso obtido não ser merecido. A vergonha do próprio sucesso, decorrente da síndrome, acaba levando muitos a se calarem sobre seus sentimentos. É importante conversar sobre o assunto com outras pessoas – colegas de trabalho, amigos, familiares ou mesmo profissionais.
Distinga sentimentos e fatos.
Todos nós nos sentimos fracassados – algumas vezes justificadamente, em outras não. É importante distinguir essas situações. Estamos certos em nos sentirmos fracassados e estúpidos? Ou estamos errados e reagindo excessivamente a uma situação?
Reconheça quando você pode de fato se sentir uma fraude.
É natural que, vez ou outra, sintamos que o sucesso não é merecido. Especialmente quando estamos começando uma carreira nova, é comum sentir inaptidão e pensar “estar atrás” dos outros. Ao invés de considerar que esse é um sinal de inaptidão, é mais produtivo reconhecê-lo como uma resposta natural para alguém que, há pouco, de fato não pertencia a aquele meio e, por isso, é preciso tempo para adaptar-se às exigências do mundo acadêmico.
Acentue seus aspectos positivos e perdoe seus próprios erros.
Ser perfeccionista não é, necessariamente, errado. Significa que você está comprometido em alcançar bons resultados e em dar o melhor de si. Mas não é saudável buscar ser perfeito em tudo, ter a obsessão de que tudo o que se faz deve ser perfeito. Há tarefas que devem ser executadas perfeitamente e outras que basta executar satisfatoriamente. E errar faz parte do jogo – por isso, perdoe a si mesmo quando erros e imperfeições acontecerem. Quase sempre é possível consertar a situação e contorná-la.
Aprenda com seus próprios erros e siga em frente.
Mais que os acertos, os erros ensinam muitas lições inestimáveis que podem impulsionar seu futuro. Portanto, reconheça-se como um ser humano imperfeito, que ainda tem muito a evoluir. Corrija os erros quando possível e siga sua jornada.
Você tem o direito de errar tanto quanto qualquer outra pessoa.
Quem padece da síndrome do impostor usualmente seguem padrões comportamentais errados. Exigem saber a resposta sempre e não gostam de pedir ajuda aos outros, mas reconhecem que todos os seus colegas têm o direito de errar, não saber uma ou outra informação e pedir ajuda. Por que os outros têm esse direito e você não? Exija de si mesmo o direito de ser igual aos demais.
Desenvolva novos roteiros de reação automática.
O “roteiro” é sua resposta mental automática a situações específicas. Quem sofre da síndrome do impostor tende a ter “roteiros” que disparam os sentimentos de inaptidão e de fracasso em determinadas situações. Ao invés de pensar ser uma fraude, por que não reconhecer suas limitações, demonstrar interesse e buscar aprender como lidar com novas situações?
Visualize seu sucesso.
Ao invés de visualizar seu fracasso, pense no que vai ocorrer quando der tudo certo e você alcançar suas metas. Como você se sentirá? Como você celebrará seu sucesso? Como será a situação concreta? Exercite sua imaginação e visualize seu sucesso, mesmo que pareça algo inatingível – como será sua apresentação, a redação do seu projeto ou a realização da prova. Muitas vezes, fazemos o inverso – visualizamos o fracasso e, não por acaso, é o que obtemos. Por que não fazer o contrário e imaginar seu próprio sucesso?
Recompense seus pequenos sucessos.
Não deixe de celebrar seu próprio sucesso. É fácil, depois de uma conquista, esquecer-se de sua importância e logo partir para outros objetivos. Mas é essencial comemorar e festejar suas conquistas, por menores que sejam. Se publicou um artigo, comemore com sua(seu) amada(o) ou um happy hour com os amigos. Não precisa ser nada extravagante. Mas comemore!
Finja o que você quer ser até se tornar o que deseja.
Não tem jeito: até você ser o que deseja, não o será. Mas só conseguirá se tentar. Ao invés de usar isso como desculpa, aprenda com quem está no lugar que você deseja ocupar. Imite seus comportamentos mais elogiosos e profissionais e descarte o que você não admira. Mas não espere se tornar suficientemente confiante para exercer os papéis que precisa imediatamente. Primeiro finja e, com o tempo, você se tornará quem deseja ser.
Mudar de atitude é o segredo
O grande segredo das estratégias seguidas pela professora é uma mudança de atitude, ainda que seja difícil. Devemos mudar como nós mesmo nos enxergamos e como nos julgamos em relação aos outros. Será que não somos muito exigentes em relação a nossa própria performance, enquanto toleramos mais os erros alheios? Será que não acabamos nos inferiorizando em relação aos demais, ao passo que deveríamos observar nossos próprios méritos? Mas há algum sentido nisso? Não. É preciso reconhecer o seu valor e saborear cada uma das conquistas ao longo de sua trajetória. Tenho certeza que, olhando para trás, todos superamos grandes dificuldades e tivemos grandes casos de sucesso nesse processo. É preciso reconhecer isso e não deixar seu sentido de autocrítica falar mais alto.
Ter a noção de que a síndrome do impostor existe é importante para refletir se não estamos sucumbindo a ela. Você poderia ter alcançado mais do que já conquistou, mas acabou se acomodando? Você se considera um impostor, alguém que não merece o que já conquistou, e por isso não assume maiores responsabilidades? Você aceita bem os elogios que recebe? Refletir sobre essas questões exige grande amadurecimento, mas pode trazer frutos enormes para seu sucesso acadêmico e profissional.